O tipo de relação que temos hoje com o tempo pode ser exemplificado com a “Linha do Tempo” do Facebook. Nesse aplicativo, o internauta pode ir para frente e para trás no tempo a qualquer momento que quiser, a seu bel prazer. E o Facebook se tornou, de fato, a rede social preferida entre os internautas, dado o seu dinamismo, possibilitando que o usuário “viva” em tempo real, fazendo-os interagir de maneira mais direta e eficaz com seus amigos (reais e virtuais).
Segundo o teólogo jesuíta João Batista Libanio, a internet nos dá a ilusória sensação de estarmos o tempo todo em todas as partes do planeta. Ou seja, a internet pode nos levar a crer que somos onipresentes, uma característica apenas atribuída a Deus.
Nesse ponto, podemos dizer que o indivíduo deseja inconscientemente não sentir o tempo passar, como se o tempo simplesmente não existisse. No livro A Peste, o escritor Albert Camus (1913-1960) diz que a única maneira de não se perder tempo é senti-lo intensamente, através de hábitos como “passar os dias na sala de espera de um dentista, numa cadeira desconfortável; viver as tardes de domingo na varanda, ouvir conferências numa língua que não se compreende; escolher os itinerários de trem mais longos e menos cômodos e viajar de pé, naturalmente; fazer fila nas bilheterias dos espetáculos e não ocupar o seu lugar, etc.” É exatamente isso que nossos contemporâneos querem evitar! Não queremos sentir o tempo passar!
A estrutura do Facebook, por exemplo, pretende encerrar a vida do sujeito dentro de sua “Linha do Tempo”, como se toda a sua existência estivesse ali concentrada, condicionando, muitas vezes, os seus usuários a esse tipo de rede.
Antes da Idade Moderna, o tempo era vivenciado de maneira totalmente diferente ao que é hoje. A conquista do espaço era o mais importante, não importando o tempo necessário para isso. O tempo que as caravelas de Cabral demoraram, por exemplo, para chegar ao continente americano não era o essencial, mas sim a conquista desse novo espaço era o que importava!
Hoje vemos estranhas relações com o tempo, como a ensinada pela doutrina espírita da reencarnação. Curioso é perceber que os dados do Censo 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados recentemente mostram que o espiritismo no Brasil é uma prática religiosa tipicamente da classe média e da classe rica. A conclusão mais óbvia que se pode extrair desse dado é que a classe de maior poder aquisitivo acredita que nascerá novamente na Terra após a sua morte para continuar usufruindo das riquezas criadas pelo nosso modo de produção.
Como escreveu o teólogo acima citado, a fé na reencarnação parece satisfazer o desejo de o indivíduo usufruir das coisas que não conseguiu usufruir em vidas pregressas, dada a enorme variedade de produtos e vivências que o sistema de produção oferece. Isso vem corroborar a evidência de que, na atualidade, o peso das tradições sobre cada sujeito é muito menor hoje que no passado, possibilitando que as pessoas se sintam livres para experimentar de tudo (tudo mesmo!) o que lhes são oferecidas pelo jogo do mercado!
Nesse caso, uma vida apenas é considerada muito breve, não sendo o suficiente para que cada pessoa desfrute de tudo o que há no mundo!
Marcos Antônio Avelino Soares.